Baseado no livro Bilionários Por Acaso, de Ben Mezrich, o filme A Rede Social (David Fincher e Aaron Sorkin, USA, 2010) conta uma interessante história com diversos níveis de compreensão, relatando a pequena epopéia vivida pelo fundador do fenômeno Facebook, Mark Zuckerberg. Cria assim o anti-herói contemporâneo definitivo, suplantando Bill Gates.
Apesar da tentativa de se mostrar imparcial, retratando as ambigüidades da personalidade de Zuckerberg, o ponto-de-vista é nitidamente favorável. Quando não consegue ser favorável por mérito do próprio, o faz com o demérito dos outros. Enquanto isso nos revela o fascinante e perigoso mundo do e-empreendedorismo norte-americano, repleto de cartadas e movimentos agressivos.
A trajetória de Zuckerberg tem muito a ver com as histórias de Bill Gates (leia Hard Drive – Desejo de Vencer, sua biografia não autorizada e certamente inspiração para o storytelling do filme), Steve Jobs (fundador da Apple, demitido pelos capitalistas aos quais abriu participação e depois aclamado de volta ao comando) e do próprio falastrão Sean Parker, fundador falido do polêmico Napster – o compartilhador pirata de arquivos de música - que grudou em Zuckerberg e é seu atual sócio.
O roteiro, maravilhosamente bem costurado por Aaron Sorkin, trata na verdade de dois grandes temas. Relacionamentos e privacidade. No que se refere a relacionamentos, a ironia mais óbvia. Apesar do Facebook ser concebido para permitir que as pessoas se encontrem, o tempo todo os personagens do filme passam por grandes desencontros. Escolhem parceiros errados e erram nas parcerias acertadas.
Zuckerberg, mostrado como um nerd socialmente inepto, tenta “programatizar” as relações por via virtual, mas falha no contato pessoal. De modo geral, todos os personagens sofrem de um horrível egocentrismo, que pauta muito das relações modernas, e, no filme, parece justamente ser o motivo dos problemas de relacionamento. A onda do Twitter é provavelmente o maior exemplo desse culto egocêntrico ao EU. Definitivamente, tecnologia ajuda, mas não resolve. Em última instância, o sucesso de relacionamentos não depende de quantidade, mas de qualidade. O segredo está antes de tudo dentro de nós mesmos, eis a mensagem.
Privacidade é outro tema crucial para o Facebook, que declarou publicamente o fim da “Era da Privacidade”. O filme mostra como somos todos públicos hoje em dia. O enredo todo gira em torno desse publicity que caracteriza as relações humanas contemporâneas.
Pessoas se expõem publicamente no Facebook, revelando até se estão ou não namorando, se envolvem em enormes movimentos de fofocas e boatos que se espalham como fogo em palha (ou como post em blog...), assumindo alternadamente o papel de alvos ou algozes, e salienta ainda como todos podem ser facilmente difamados publicamente em troca de interesses financeiros ou simplesmente decepções sentimentais.
Vivemos em uma era de publicity no qual o Facebook é apenas mais uma ferramenta, que teria mesmo que surgir em algum momento para apoiar essa tendência. A exposição pública pode ser controlada e planejada ou ser feita à força, de maneira negativa, incontrolada ou inconsequente.
A sessão do filme foi curiosamente antecedida por uma ação de comunicação bem interessante realizada pelo portal de notícias iG nos cinemas, que informa na telona suas principais manchetes daquele dia.
E a primeira delas era justamente sobre a prisão de Julian Assange, o fundador do mais polêmico de todos os empreendimentos da internet até agora, o WikiLeaks, que publica vazamentos de informação sigilosa de governos e grandes corporações. Ele está sendo acusado (e difamado) por dois supostos casos de estupro, que nega.
Destaque para a versátil trilha sonora, que consegue mesclar bandas indies atuais como Super Furry Animals e White Stripes intercaladas por mainstreams das antigas como Beatles, Bob Marley e outros nem tanto como The Cramps.
* Texto: Nelson Doy Jr., publicitário, amigo querido que sempre empresta sua mente privilegiada para a seção Cinematografando, deste meu quantinho no cyberespaço. E que curte os espaços reais do Lado B quando vem à soterópolis.
Imagens: www.imdb.com
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